segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Sexualidade e (In)Satisfação Conjugal - Dois lados da mesma realidade?



 O que fazer quando um casal não consegue entrar em sintonia no que diz respeito à sua sexualidade?
E quando a sexualidade em vez de ser um espaço de intimidade se torna arma de arremesso para lidar com outros problemas conjugais? 
O que significa ter uma vida sexual satisfatória? 
Qual a frequência ideal das relações sexuais? 
E quando um dos elementos se anula, aceitando iniciar o acto sexual só porque o companheiro(a) o quer fazer?

Habitualmente os casais são confrontados por um conjunto de questões nesta área, muitas vezes condicionados pelas crenças que foram interiorizando ao longo do seu percurso de vida, mas também por um conjunto de informação que é transmitida erroneamente através de mitos e tabus associados a esta temática, bem como pelos significados que são valorizados pela nossa sociedade.

 Existe uma influência sócio-cultural nesta área, o que condiciona aquilo que o casal espera um do outro. Esta situação pode acabar por afectar o casal, fazendo-o viver a sexualidade com alguma tensão. 

É importante ter em conta que cada casal deve construir as suas próprias regras neste campo, não existe o certo ou o errado desde que os dois elementos estejam satisfeitos e confortáveis na práctica sexual, podendo esta ser divergente da de outros casais.

A Sexualidade assume um papel essencial nas relações conjugais, sendo umas das componentes com grande impacto no bem-estar do casal. 

Considera-se que a satisfação sexual está estritamente relacionada com a satisfação geral na relação, sendo que os factores que condicionam a insatisfação sexual são divergentes para ambos os sexos. 

O sexo feminino, no âmbito da sexualidade, valoriza aspectos como o amor, afeição e carinho, para que a relação sexual seja satisfatória. Enquanto, que para o sexo masculino, a frequência e a variedade de actividades sexuais são habitualmente os factores mais importantes. Estes elementos podem provocar conflitos entre o casal por existirem necessidades diferentes para os dois e divergentes formas de expressão das mesmas. 
Assim é necessário que sejam comunicados e partilhados pelo casal, de modo a que possam fazer negociações, para que ambos se sintam preenchidos e satisfeitos nesta área. 

É importante ter em conta que a sexualidade no casal não é desprovida da componente afectiva, sendo que aspectos que provocam desagrado na relação podem provocar o desencantamento e, consequentemente, o afastamento de um dos elementos, ficando comprometida a intimidade do casal. 

A sexualidade deve ser encarada como um elemento fundamental de partilha e intimidade, onde se conjugam os afectos, as fantasias, as aspirações, compromisso e investimento, sendo a junção destes factores uma importante fonte de manutenção do relacionamento, produzindo um cocktail de harmonia e satisfação conjugal.

Frequentemente o que falha neste campo é o facto de se agir com o(a) companheiro(a) como se ele ou ela pensasse e valorizasse os mesmos aspectos na sexualidade, não tendo em conta aquilo que é importante para ele(a).

Homens e mulheres funcionam de forma diferente, o que não tem que ser necessariamente um obstáculo na relação. 

A forma como os homens sentem e expressam amor pelas suas companheiras está estritamente interligado ao relacionamento sexual. Durante o acto sexual ele está mais disponível para dar e receber amor. Assim, se perante a sua iniciativa de iniciar a relação sexual a mulher recuar, geram-se sentimentos de rejeição, sendo este um dos grandes desafios para relação, isto é, gerir os tempos de cada um e os significados que são atribuídos por ambos no que se refere a essa situação. Quando a parceira vai continuamente recusando as investidas do companheiro, sem qualquer tipo de explicação, pode surgir, devido aos pensamentos e sentimentos não expressos, afastamento da parte do homem e até mesmo perda de desejo em relação à mesma, pois sempre que é recusada a actividade sexual, o homem tem que suprimir o seu desejo. Se esta situação acontecer repetidamente, o desejo vai sendo suprimido automaticamente, gerando um grande desgaste para o mesmo. 

O mesmo acontece com a mulher, quando sente que as suas necessidades de afecto, de atenção não são respeitadas vai-se progressivamente afastando, ficando menos receptiva ao acto sexual. Mas como este aspecto não é partilhado com o companheiro vão-se gerando mágoas e ressentimentos, ficando comprometido o relacionamento, mesmo nas outras áreas. Neste caso, quando não há o compromisso de comunicar com o outro as suas necessidades ou quando não há disponibilidade para entender aquilo que o outro precisa, pode-se estar a criar espaço para que outros os encantem, podendo surgir as relações extraconjugais como fonte de satisfação dos desejos sexuais que são reprimidos ou não satisfeitos na relação actual, mesmo que possa estar preservado o sentimento pelo outro. 

Estas situações podem mesmo gerar rupturas conjugais, pois um dos elementos do casal pode sentir que as suas necessidades não são consideradas importantes pelo outro. Para além disso, a existência de outros problemas conjugais, ao não serem resolvidos afecta a vida sexual do casal. Assim, é necessário existir um investimento das duas partes para melhorar a relação sexual, não descurando as necessidades do outro, bem como tentar perceber e resolver os outros problemas ou dificuldades que estão a ter repercussões no bem-estar do casal.

Podem, assim, surgir várias queixas no casal em relação a esta temática da sexualidade,  associadas à insatisfação que podem estar interligadas com a frequência, com o contexto, tipo de experiências sexuais ou com a emocionalidade, bem como com a existência de disfunção sexual apresentada por um ou ambos os elementos. 

As disfunções sexuais são transtornos associados a aspectos fisiológicos do ciclo da resposta sexual, que incorpora o desejo, excitação e orgasmo. 

As disfunções sexuais podem surgir nestas três componentes, dando origem à falta de desejo, impotência, ejaculação precoce ou retardada e incapacidade de atingir o orgasmo.

 Quando surge um destes problemas é necessário procurar ajuda médica, para perceber se existe uma causa biológica, sendo necessário o tratamento medicamentoso, mas também analisar se a disfunção tem uma causa psicológica ou se é provocada pelo stress, cansaço, estilo de vida, entre outros. 

Nessas situações o casal pode necessitar também de apoio, para repensar a sua relação sexual e para aprender a lidar com as suas próprias necessidades e com as do(a) companheiro(a), tornando-os mais capazes de ultrapassar as exigências que surgem na fase de vida em que se encontram. 

Para além disso, alguns estudos têm demonstrado que as disfunções sexuais podem estar associadas à disfuncionalidade da própria relação, isto é, determinados comportamentos do casal podem reforçar o problema sexual existente. 

A Terapia de Casal pode permitir melhorar a comunicação do casal, ultrapassando grande parte dos bloqueios que estão associados à actividade sexual, facilitando a construção e a definição da sua sexualidade, aumentando a satisfação e, consequentemente, potenciando uma maior aproximação do mesmo. 

Para além disso, com o evoluir da relação, o desejo sexual pode ir diminuindo, contaminado pela rotina do casal, pelo nascimento dos filhos e pelo rol de exigências que vão surgindo na vida de cada um, sendo por isso importante que o casal continue a investir na relação e que reconquiste a atracção. 

A Terapia de Casal pode facilitar este processo de descoberta de si próprio e do outro, permitindo derrubar o muro do silêncio e do ressentimento que se pode ir construindo entre os elementos do casal. 


Por Sónia Ferreira, Psicóloga Clínica e Terapeuta de Casal

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

“Terapia a dois” – Da ficção à realidade



O filme “Terapia a dois” neste momento em exibição, retrata de uma forma aligeirada o desgaste que se vai instalando numa relação de 30 anos, demonstrando como o aparecimento da rotina, o aumento da insatisfação, associado à falta de comunicação, pode deitar por terra um projecto de vida. E quando tudo isto acontece numa relação com menos anos de existência? Quando a angústia e a incerteza se instalam, o que fazer para não tomar decisões precipitadas?

Uma das dificuldades mais frequentes no relacionamento conjugal passa pela insatisfação que se vai instalando, muitas vezes, de uma forma silenciosa, gerando afastamento entre o casal. 
O decorrer da relação pode trazer alguma desilusão, quando as expectativas que se construíram acerca da mesma acabam por ser defraudadas e quando existe uma certa idealização do outro. Nem sempre o outro corresponde integralmente à imagem que se traçou dele inicialmente, existe uma certa tendência para se anular as diferenças e acentuar as qualidades que encantam ou seduzem a pessoa. 

No entanto, todas estas decepções podem ser ultrapassadas, sem ganharem um carácter destrutivo se o casal estiver disponível para investir na relação, de modo a que a satisfação conjugal seja uma meta partilhada pelos dois elementos, pois considera-se que o amor deve ser continuamente alimentado e rejuvenescido.

Nessa perspectiva, é fundamental expressar as suas necessidades e desejos, bem como o que espera do(a) companheiro(a), no âmbito da relação. Muitas vezes, é aqui que reside o problema. A comunicação assume um papel fundamental na resolução de conflitos, permitindo que discórdias possam ser clarificadas. No entanto, habitualmente, o casal opta por não comunicar, para não se expor ou para não comprometer a relação, gerando, por outro lado, dificuldades de entendimento. Nesta medida, vai-se instalando, progressiva e silenciosamente, um mutismo fruto de um rol de “ocorrências” em que tudo se transforma: os pequenos deslizes passam a ser interpretados como defeitos irreparáveis, o dia-a-dia tão desejado, torna-se numa rotina insuportável e enfadonha. A partilha de uma vida em comum passa a ser evitada. O diálogo sobre pensamentos, sentimentos e expectativas acaba por se restringir ao essencial. 

Neste contexto, é necessário ter em conta ainda que quando a comunicação de um casal se centra na crítica, no ataque constante ao outro e no desprezo, pode gerar o desinvestimento e desencanto da parte do outro, o que irá prejudicar a resolução dos problemas.

No relacionamento conjugal também é importante ter em conta a forma como se gere a individualidade de cada um, para além do projecto a dois. Este deve permitir o crescimento e o desenvolvimento de cada elemento, proporcionando bem-estar. Desta forma, o casal não tem que viver exclusivamente um para o outro, não devendo negligenciar os seus projectos individuais.

 Para tal, é necessário que o(a) parceiro(a) aceite este aspecto, não devendo considerar estar perante uma falha ou demonstração de desinteresse ou de falta de afecto da parte do outro, mas sim respeitar o seu espaço e necessidades pessoais. Torna-se fundamental respeitar as idiossincrasias, tendo em conta que homens e mulheres percepcionam as relações de forma diferente, valorizando divergentes aspectos na relação, o que não tem que representar necessariamente um problema. Para além disso, não se pode descurar o facto de o casal ser descendente de famílias com valores e modelos díspares. Cada um leva uma herança do que é, e de como deve ser vivida a relação a dois, sendo por isso necessário existir uma reorganização para que possam construir o seu próprio modelo, incorporando valores dos dois lados.

Vários elementos tem sido considerados pelos casais, de modo a manter a satisfação conjugal, nomeadamente a confiança, o compromisso, apreciação, respeito, amor, a sensibilidade aos sentimentos do outro, a comunicação aberta e honesta, a capacidade de resolução dos problemas, a partilha no processo de tomada decisão, a qualidade da relação sexual, a partilha da educação dos filhos, o demonstrar interesse pela opinião do outro, entre outros. 

Nem sempre o casal consegue atingir a harmonia e o equilíbrio conjugal sozinho, mantendo a satisfação nestas várias vertentes, sendo necessário recorrer à Terapia de Casal. Esta vai proporcionar um espaço de partilha, favorecendo a expressão de emoções, bem como facilitando uma outra forma de estar e de comunicar, diferente daquela que o casal utiliza habitualmente. Procura-se analisar os factores que estão a desgastar e a degradar a relação, fomentando uma maior consciência acerca do funcionamento do casal, que pode estar a bloquear a manutenção da satisfação e do reajustamento às necessidades que vão surgindo ao longo do tempo. É necessário aceitar que o objectivo não é mudar o(a) companheiro(a), mas sim alterarem alguns aspectos da relação, através da negociação do que cada uma das partes pode facultar, para que se possam sentir mais satisfeitos na relação. 

Assim, a Terapia de Casal pode ser indicada para situações em que ocorre o desinvestimento de um dos elementos, quando existiu uma relação extra-conjugal, quando aparece a insatisfação, no caso de dificuldades ao nível da comunicação, da relação sexual, quando o conflito conjugal se centra na relação tensa com a família de origem, quando ocorrem dificuldades na gestão e tomada de decisão dos aspectos educativos dos filhos ou, simplesmente, quando querem melhorar a qualidade do relacionamento. E no fim de tudo, mais do que um final feliz, o que realmente faz a diferença é ser honesto consigo mesmo e com o outro, tomando consciência do processo evolutivo quer individual, quer conjugal.

Por Sónia Ferrreira, Psicóloga Clínica e Terapeuta de Casal.